quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Linguagem fática

Conversa no orkut:

- Oi, te vi ali na pista de cooper? Vc tá boa?
- Qto tempo! vc me viu no carro neh? to bem, namorando, estagiando rsrsrs e vc? saudades! bjoos

E nunca mais se falaram.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Entre xícaras e letras


Engraçado. Eu odiava café antes de entrar para a faculdade. E minha mãe sempre me condenava por isso. Um de seus argumentos era o aroma surpreendente da bebida, forte e único. Mamãe celebrava as múltiplas possibilidades do consumo do café. Ele pode ser servido, afinal, de várias maneiras: com açúcar, com chantilly, na versão light, com adoçante; ou então de vários sabores: café sabor menta, café sabor canela. Sim, lá em casa já teve de todos esses tipos. Mas como gosto cada um tem o seu, preferia não discutir.

Os benefícios terapêuticos do copo negro era outra tentativa usada por ela para que eu mudasse de opinião. “O café forma, durante a torra adequada, produtos que ajudam a inibir o desejo de consumir álcool”; “estudos modernos mostram que o consumo regular de café protege contra o surgimento da diabetes do adulto”; “ao contrário do que se pensava, o consumo moderado de café pode fazer bem ao coração”; “o café aumenta a vitalidade e a atenção”; “café: uma arma contra o sono”. Consultas superficiais à internet me ajudavam a contra-argumentar: “A cafeína possui um potente efeito diurético, prejudicando a hidratação em atividades prolongadas”; “a cafeína não representa nenhum valor nutricional para o organismo humano, se restringindo apenas ao seu efeito excitante”; “estudos mostram que 1 xícara de café é capaz de reduzir a absorção do ferro em 30% pelo organismo”.

Mamãe, em sua fase mística, insistia. Falava que era só tomar meio copinho de café com o pó, deixar a xícara utilizada repousando durante uma noite e, no outro dia, naquele singelo recipiente, seria possível ler, através da borra, o meu destino. Sim, meus caros, ela me disse isso. O que eu respondi? Preferi ignorar. Mas os benefícios reais do café eu só vim entender já na faculdade, de jornalismo. Pelo senso comum, o próprio jornalismo está naturalmente associado ao consumo do café. Quando imaginamos um jornalista de redação, por exemplo, logo pensamos num computador velho, num telefone que toca insistentemente, e, é claro, na dupla imbatível, café e cigarro. À nicotina, pelo menos, eu não me rendi.

Foram nos corredores da Fafich que descobri a impressionante capacidade do café em ser um excelente meio de socialização. Quem nunca encontrou um amigo, de repente, e foi interrogado: “Vamos tomar um café?”. Sim, afirmo, com propriedade, conhecimento e sem dúvidas, café é sinônimo de conversa jogada fora, de bate-papo. E não apenas disso. Numa conferência ou seminário, temos um coffee break. A primeira refeição do dia é o café da manhã. Um encontro de negócios é marcado, antes de tudo, pela pergunta: “Aceita um café?”. Essa pergunta, inclusive, parece ter a função de testar o canal de comunicação entre os interlocutores. O que me parece é que quem está oferecendo o café o faz por mera convenção, podendo substituir a pergunta por um: “Oi”, ou, mais diretamente: “Vamos aos negócios?”.

Mas foi o pelo primo rico, o cappuccino, bebida que mescla leite, chocolate e, é claro, café, que a minha relação com este se iniciou. A adesão final se deu nas noites intermináveis em frente ao computador. O pretinho era básico para que eu me mantesse de pé, meu único companheiro da madrugada. Era pressuposto para que eu conseguisse finalizar o trabalho a ser entregue na manhã seguinte. E assim ele me conquistou. Nos meus momentos de fragilidade e desespero, estava sempre presente, me dando aquela força. E agora, leitores, entre um gole e outro de café, eu me redimo e os aconselho: sempre escutem as sábias palavras de suas mães.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Escolhas

Jabaquara ou Tucuruvi. Alto Ipiranga ou Vila Madalena. Itaquera ou Marechal Deodoro. Entrou no metrô sem bem saber se era mesmo este o destino certo. Mas a avalanche do tempo não dá espaço à dúvida. A vida é escolha a cada passo. As portas se fecharam nas suas costas e aí já era hora de escolher novamente, desta vez a cadeira que iria sentar. Do lado de homem ou de mulher. Na cadeira cinza ou na marrom. Acabou empurrado pela “ação e reação” do trem, tropeçou e foi logo sentando na primeira cadeira a sua frente, antes que caísse no chão.

Ao seu lado, uma senhora amável, com um pacote no colo, foi logo dizendo:

– Iiii... Vai ter que agüentar o cheiro de frango...
– Que isso! O cheiro está gostoso, onde a senhora comprou?

A velhinha, dessas de cabelos grisalhos curtos e óculos, tentou lhe explicar.

– Conhece? – indagou.
– Hum, não... Não sou daqui, mas é sempre bom saber, porque quando eu voltar...

Foram dois ou três minutos de conversa, não mais que quatro estações e muitas palavras ditas despretensiosamente. Ali, fez-se da cadeira do metrô divã de analista. Uma voz grave anunciou a estação e lá foram a senhora e o frango. Antes disso, ela lhe desejou sorte na vida e muita felicidade, daquele jeito mais amigo. Para ela, ele era um jovem muito jovem cheio de vontade. Para ele, tudo aquilo era um tropeço transformado em escolha acertada.

Ficou ainda pensando sobre esses encontros felizes, até que novos passageiros entraram no metrô. Ao seu lado, sentou uma menina, que depois descobrira ter 11 anos, e o pai, quase avô. O senhor estava feliz, pois, ao chegar a casa, descansaria o som de música clássica. Falava para o filha, mas a impressão era que, na verdade, tentava conversar com o rapaz, a quem ofereceu algumas bolachas de chocolate e, de volta e meia, encarava no fundo dos olhos.

Bem alto, porém em tom sereno, o homem ressaltava a importância da meditação e de se traçar objetivos concretos na vida.

– Meditar, filha, é dizer algo para a mente, entendeu?

A menina olhava com os olhos arregalados para o pai, que continuou:

– A gente é preguiçoso, esquece das coisas rápido. Então, se você quer algo, primeiro, tem que dizer para sua mente. Por exemplo, daqui há sete anos você fará vestibular. Então, tem que pensar “eu consigo, eu vou, eu quero, eu posso”. Aí você consegue.

Terminou a frase olhando firme para o garoto, que concordou com tudo, e perguntou:

– O que é meditar mesmo?

– É dizer algo a mente.

O rapaz teve vontade de escutar mais aquele senhor. Sua estação chegara, uma pena. Era preciso partir, até porque há muito dizia certas palavras para a própria mente. A escolha estava tomada e era preciso confirmá-la, antes que a avalanche do tempo destruísse tudo ou que a memória tratasse de apagar, até os sonhos.