segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Escolhas

Jabaquara ou Tucuruvi. Alto Ipiranga ou Vila Madalena. Itaquera ou Marechal Deodoro. Entrou no metrô sem bem saber se era mesmo este o destino certo. Mas a avalanche do tempo não dá espaço à dúvida. A vida é escolha a cada passo. As portas se fecharam nas suas costas e aí já era hora de escolher novamente, desta vez a cadeira que iria sentar. Do lado de homem ou de mulher. Na cadeira cinza ou na marrom. Acabou empurrado pela “ação e reação” do trem, tropeçou e foi logo sentando na primeira cadeira a sua frente, antes que caísse no chão.

Ao seu lado, uma senhora amável, com um pacote no colo, foi logo dizendo:

– Iiii... Vai ter que agüentar o cheiro de frango...
– Que isso! O cheiro está gostoso, onde a senhora comprou?

A velhinha, dessas de cabelos grisalhos curtos e óculos, tentou lhe explicar.

– Conhece? – indagou.
– Hum, não... Não sou daqui, mas é sempre bom saber, porque quando eu voltar...

Foram dois ou três minutos de conversa, não mais que quatro estações e muitas palavras ditas despretensiosamente. Ali, fez-se da cadeira do metrô divã de analista. Uma voz grave anunciou a estação e lá foram a senhora e o frango. Antes disso, ela lhe desejou sorte na vida e muita felicidade, daquele jeito mais amigo. Para ela, ele era um jovem muito jovem cheio de vontade. Para ele, tudo aquilo era um tropeço transformado em escolha acertada.

Ficou ainda pensando sobre esses encontros felizes, até que novos passageiros entraram no metrô. Ao seu lado, sentou uma menina, que depois descobrira ter 11 anos, e o pai, quase avô. O senhor estava feliz, pois, ao chegar a casa, descansaria o som de música clássica. Falava para o filha, mas a impressão era que, na verdade, tentava conversar com o rapaz, a quem ofereceu algumas bolachas de chocolate e, de volta e meia, encarava no fundo dos olhos.

Bem alto, porém em tom sereno, o homem ressaltava a importância da meditação e de se traçar objetivos concretos na vida.

– Meditar, filha, é dizer algo para a mente, entendeu?

A menina olhava com os olhos arregalados para o pai, que continuou:

– A gente é preguiçoso, esquece das coisas rápido. Então, se você quer algo, primeiro, tem que dizer para sua mente. Por exemplo, daqui há sete anos você fará vestibular. Então, tem que pensar “eu consigo, eu vou, eu quero, eu posso”. Aí você consegue.

Terminou a frase olhando firme para o garoto, que concordou com tudo, e perguntou:

– O que é meditar mesmo?

– É dizer algo a mente.

O rapaz teve vontade de escutar mais aquele senhor. Sua estação chegara, uma pena. Era preciso partir, até porque há muito dizia certas palavras para a própria mente. A escolha estava tomada e era preciso confirmá-la, antes que a avalanche do tempo destruísse tudo ou que a memória tratasse de apagar, até os sonhos.

2 comentários:

Patrícia Ferraz disse...

e ele vai conseguir. cedo ou cedo, eu sei.

Ayer disse...

O destino da boas trombadas na gente, um dia acorda ou prolonga o sono no caixão.

amei o texto Flavinha.

Daniel